Inicio minha escrita transcrevendo um triste poema, mas esteticamente belo, do nosso Guimarães Rosa. O poema, chamado Revolta, encontra-se em seu livro Magma, editado pela Nova Fronteira. Na nota editorial encontro a seguinte novidade: “Quase uma lenda, a história deste livro não é de todos conhecida. Premiado em 1936, permaneceu inédito desde então. Conhecido de uns pouco, inacessível a muitos, aguardado durante longo tempo, tinha uma existência clandestina”.
Revolta
Todos foram saindo, de mansinho,/ tão calados/ que eu nem sei/ se fiquei mesmo só. Não trouxe mensagem/ e não me deram senha…/ Disseram-se que não iria perder nada,/ porque não há mais céu./ E agora, que tenho medo,/ e estou cansado/ mandou-me embora… Mas não quero ir para mais longe,/ desterrado/ porque a minha pátria é a memória./ Não, não quero ser desterrado, / que a minha pátria é a memória…
Todos foram saindo, de mansinho,/ tão calados/ que eu nem sei/ se fiquei mesmo só. Não trouxe mensagem/ e não me deram senha…/ Disseram-se que não iria perder nada,/ porque não há mais céu./ E agora, que tenho medo,/ e estou cansado/ mandou-me embora… Mas não quero ir para mais longe,/ desterrado/ porque a minha pátria é a memória./ Não, não quero ser desterrado, / que a minha pátria é a memória…
Tomo como metáfora o poema de Rosa para pensar na nossa pátria. Toda hora fico sabendo de pessoas e até de amigos que foram embora do Brasil, e outros, fazendo planos para “desterrar”. Outro dia, ouvi de meu filho que mora no exterior, dizer: “pai, caso pudesse, tiraria você, minha mãe e minha irmã daí. Não acredito mais no meu país”.Impactado com essa fala, de coração partido, pensei: Que coisa dolorosa ouvir de um filho que, por amor, por consciência política, desejar exilar seus pais e irmã! Fico imaginado quantos jovens estão perdendo o senso de Pátria; quanto jovens estão desesperados, descrentes com o presente e o futuro de uma nação que, como nos versos de Guimarães, lemos:
Disseram-me que não iria perder nada,porque não há mais céu.e agora, que tenho medo,e estou cansado,mandam-me embora…
Estamos, gradativamente, perdendo direitos sociais, aposentadoria compatível com boa qualidade de vida, educação que sucumbe: segundo a Agência Nacional de Alfabetização, com 54% da população não a saber ler, escrever, fazer conta. Educação que não se ensina um saber humanístico, e só se preocupa com a promessa de uma vida de consumo, de estudar para vestibular, e quem sabe, sair do problema para a “nova classe média” que já ruiu endividada e completamente alienada politicamente.
Sem educação, consciência político-social, saúde, justiça e segurança, quem serão os jovens do futuro governante de um país? O que nos oferecem, nossos políticos e governantes? Reformas enganosas que mantêm o “velho coronelismo” e “currais eleitorais” perpetuando a riqueza e o poder de decisões em mãos de poucos. “Não quero ir para mais longe, desterrado”, grita de revolta o poema daquele tal qual Graciliano Ramos, José Lins do Rêgo, Euclides da Cunha, João Cabral de Melo Neto, que lutaram e sucumbiram na defesa dos mais pobres.
Que a juventude atual saiba, ainda, que há esperança, e que nessas próximas eleições possa contribuir para votar em políticos e grupos partidários (é claro que deve haver exceções) que tenham o mínimo de formação política, consciência de respeito, consideração, compromisso e paixão pelas causas sociais. Caso contrário, estarão criando condições para regimes ditatoriais, tanto de direita como de esquerda! Aí faz sentido, “disseram-me que não iria perder nada, porque não há mais céu. E agora, que tenho medo, e estou cansado, mandam-me embora…”