Reza a lenda que em Salvador os festejos carnavalescos perduram durante todo o ano. Há uma exceção: o povo baiano e a Igreja Católica fizeram um acordo para, na Semana Santa, transferir o carnaval para a Ilha de Itaparica. Ou seja, o baiano passa mesmo o ano todo festejando o Momo, isto é, podemos inferir que em Salvador não existe quarta-feira de cinzas, continua a exaltação e excitação momesca, o que me faz pensar numa cultura predominantemente excitada, maníaca. No entanto, sabemos que uma excitação exagerada, o estado maníaco, segundo a psiquiatria e a psicanálise, são mecanismos de defesa de uma depressão.
Ato contínuo, epidemiologicamente, a Bahia é um estado onde os índices depressivos são altos. Será ainda a não elaboração do luto do banzo africano? Será que a tristeza perene é um aspecto melancólico da perda da África? A cultura negra é predominante naquele estado; foi dos cantos tristes dos negros nos canaviais que nasceu o Blues, uma música triste, geralmente em tons menores e acordes que junto às melodias nos fazem até chorar. Se essa hipótese tem sentido, de um lado, vemos uma competência para fugir da depressão através de um estado excitatório; do outro, uma dificuldade de fazer luto.
Elaborar um luto, uma perda, é um processo psicológico que tem começo, meio e fim, caso contrário essa perda, esse luto se transforma em depressão, melancolia, ou na permanência de uma defesa que nega a dor psíquica da perda.
No funcionamento individual, existem pessoas que não suportam sofrer suas perdas, e para não fazer processos reparadores, vivem a vida num estado hipomaníaco, excitado, acelerado, impedindo a mente de pensar, funcionando por atos e ações.
Wilfred Bion, conhecido psicanalista inglês-indiano chamou isso de um “funcionamento muscular”, uma mente muscular, onde a capacidade para pensar a experiência emocional, examiná-la e dela tirar proveito, sucumbe, deixando a pessoa numa depressão de base, mesmo que possa viver o dia a dia.