Até agora não sabia o que queria escrever hoje. Escrever uma coluna, uma crônica. Um pequeno ensaio para um jornal eletrônico é sempre uma ousadia, um desafio, uma capacidade de remoer minhas vísceras psíquicas em procura do quê? Não sei. Não me agrada muito a escrita por encomenda, elejo sempre a minha intuição, e toda vez que sento em frente ao computador sou enredado por um branco, um vazio. Isso é bom, é desafiante, pois me obriga a esperar duas coisas essenciais: os estertores de uma intuição que começa a surgir e a liberdade da livre associação de ideias.
Onde quero chegar não sei, só sei que minha escrita só tem valor para mim se sair do pessoal, do autobiográfico em direção a um público que possa não ler meu escrito, mas se lê nele, caso contrário, como dizia Borges, o argentino, e Clarice, nossa diva, a arte não seria arte.
Às vezes caio no abismo do branco, do vazio, do não pensamento, do não ter ideia. Isso me fascina, me angustia, mas é do nada que sai alguma coisa criativa. Ninguém escreve o que já sabe, até porque não se sabe de nada. A escrita é uma maneira de apreender a realidade interna do ser-no-mundo assim como o seu contexto histórico e social. Para isso, há que se ter uma apreensão estética e um sentimento de empatia com a humanidade. Quem são os personagens de uma escrita senão nós mesmos? Há uma linha tênue entre o escritor, o narrador e os personagens. A escrita se faz na dor, na dor humana. Os grandes mestres, os maiores romancistas sempre mostram que suas obras saiam das dores do mundo mais do que das alegrias.
“Amor, doença e morte, os elementos noturnos da mística romântica, mitos gregos, culto fálico, efebolatria e nostalgia da beleza unem-se numa poesia de tétrico ânimo de decadência e sombrio reconhecimento do perigo teísta do espírito ocidental… Ambíguo é o belo, a forma, ambíguos são todos os entendimentos, ambíguo é o amor, mas antes de tudo o ente humano”, escreveu Anatole Rosenfeld em seu ensaio Um Esteta Implacável sobre a maravilha de obra de Thomas Mann, um dos maiores escritores do início do Sec. XX.
Escrever é isso, uma experiência difícil, dolorosa. Raramente leio o que escrevi após sua publicação. Quem sabe não teria escrito! Mas, vale a pena, apreender de dentro da gente alguma coisa que o leitor possa se identificar e pensar. Não gosto de ser lido por simples consumismo literário, o que não é nada literário.
Escrevo esperando intuição e inspiração e aproveito sempre nos meus escritos fragmentos de autores que me fizeram ler a minha intimidade. “E o ato de criar é fidelidade aos sonhos. Se não acreditamos neles, como acreditaremos em nós”, disse um dia nosso escritor, Carlos Nejar.