Desde 1904, os escritores alemães, Thomas Mann e Herman Hesse, travaram uma amizade sólida, com vários encontros e dezenas de cartas. Ambos sempre se posicionaram contra a burguesia, muito embora fossem de origem burguesa. Os dois receberam por suas obras o prêmio Nobel de Literatura. Entre várias obras escritas pelos dois, merece assinalar de H. Hesse “O Jogo das Contas de Vidro” (1943), e Thomas Mann em 1947, “Doutor Fausto”. Nessas duas obras os autores “descrevem com assustadora exatidão o esfacelamento total do mundo burguês. Hesse o chama de “idade do folhetim”, do qual eles mesmos eram frutos e ao qual ambos ainda estavam presos na tensão de ódio/amor. Além disso, as duas obras são expressão da confiança no humanismo como única resposta possível a esse esfacelamento, para que ele não conduza ao caos absoluto e à anarquia”, assinala Theodore Ziolkoski no Prólogo do livro “Hermann Hesse e Thomas Mann –Correspondência entre amigos”, Editora Record.
As cartas entre os dois escritores são atuais, na medida em que seu conteúdo versa sobre as questões ideológicas e políticas do começo do Séc. XX na Alemanha e na Europa e parecem se repetir no nosso tempo. A sociedade pós-moderna vem mostrando ao mundo um exagero de facções tanto de direita como de esquerda, ambas num conluio paradoxal de um mercantilismo perverso e uma política assistencialista, deixando de lado a formação do ser humano, a formação dos jovens quanto à orientação humanista.
Vivemos no mundo do Ter e não do Ser; vivemos numa política educacional preocupada somente com profissões técnicas, programas orientados para o vestibular, credos religiosos. É notória a falta de incentivo programático nas áreas de ciências humanas, como se o saber fosse unicamente intelectual e econômico. A Cultura, a Literatura, as Artes e a Filosofia são a base do saber humanístico, resgatando os valores éticos e morais, transmitindo aos jovens o sentido crítico da vida humana, da preservação do nosso meio ambiente e da noção de alteridade. Uma democracia não se perdura sem o atendimento aos direitos humanos fundamentais, assim como a liberdade de pensamento.
Num poema de H. Hesse a Thomas Mann, datado de 1933, preocupado com a falta de fé e amor reinantes, escreve esses versos: “Duro é seu caminho, morte e pecado seu alimento,/ erra na escuridão, e muitas vezes/ preferia não ter sido criado./ Mas eterno brilha sobre ele seu destino,/ sua missão: o espírito de Luz./ E sentimos: a esse ameaçado/ o Eterno ama com especial amor./ Por isso nós, irmão, errantes,/ somos capazes de amar mesmo divididos,/ e não é o julgamento ou ódio/ que nos aproxima da sagrada meta,/ e sim paciente amor, amável tolerância.”