Catástrofe Narcísica: Teresa Pinheiro discute trauma, tempo e ternura em encontro da Sociedade de Psicanálise de Brasília

Evento marcou lançamento da obra em Brasília

A Sociedade de Psicanálise de Brasília (SPBsb), por meio de sua Diretoria Científica, realizou o lançamento do livro Catástrofe Narcísica, acompanhado de um bate-papo com a autora, a psicanalista Teresa Pinheiro. A conversa, mediada pela psicanalista Maria Nilza Campos, reuniu profissionais, estudantes e públicos em geral, para refletir sobre temas fundamentais da psicanálise contemporânea, como trauma, subjetividade, aceleração tecnológica, descolonização do pensamento e a aposta na ternura como possibilidade ética no mundo atual. O Evento ocorreu no dia 29 de novembro, no Platô Livraria, na Asa Sul.

A diretora científica da SPBsb, Nize Nascimento, abriu o encontro destacando a importância da circulação do pensamento e da presença da autora em Brasília, que possui ampla formação acadêmica. 

Teresa Pinheiro é psicanalista, Doutora em Psicanálise pela Universidade de Paris 7, pesquisadora da obra de Ferenczi desde 1982. Fundou e coordenou o Núcleo de Estudos em Psicanálise e Clínica da Contemporaneidade – NEPECC/UFRJ. É Membro Emérita do Grupo Brasileiro de Pesquisa Sándor Ferenczi.

Nize também celebrou o momento histórico vivido pela Sociedade de Psicanálise de Brasília, que completou 55 anos dedicados à formação, ao estudo e à difusão da psicanálise na Capital, “um caminho tecido por muitas gerações de analistas, docentes, membros do IPVLB e colegas que sustentaram, e continuam sustentando, esta nossa casa”.

“Ao longo desses 55 anos, a SPBsb consolidou seu Instituto, ampliou seus espaços de interlocução e manteve vivo o compromisso ético que orienta nossa prática. Que este encontro, que celebra um livro, uma autora e uma interlocução tão preciosas, seja também uma parte luminosa dessa história que se renova a cada gesto, a cada palavra e a cada troca sensível”, disse Nize Nascimento.

Redescobertas de Ferenczi e a formação da autora

Ao narrar sua trajetória acadêmica, Teresa Pinheiro relembrou o impacto de ter sido convidada a pesquisar Sándor Ferenczi, figura então pouco difundida na França. A descoberta da obra ferencziana, marcada por censuras e distorções históricas, tornou-se o ponto de virada de sua tese de doutorado. “Foi nos últimos minutos do segundo tempo que percebi: desde o começo, Ferenczi tem uma preocupação com a questão traumática inteiramente diferente de Freud”, afirmou.

Desalojar e descolonizar: tarefas da psicanálise no Brasil

Provocada por Maria Nilza sobre o “desalojamento” da psicanálise do eixo Sul-Sudeste, provocado pela vinda da psicanálise para Brasília, trazida pelas mãos de Virgínia Bicudo, e sua expansão para novos contextos, Teresa retomou o pensamento de Ferenczi para discutir a descolonização do campo analítico.

Ela relembrou o artigo de 1908, “Do alcance da Ejaculação Precoce”, no qual Ferenczi identificava uma colonização do pensamento feminino, processo que, segundo Teresa, ecoa hoje nos desafios de uma sociedade ainda marcada pelo passado escravocrata e por formas conservadoras de subjetivação. “Também o corpo teórico da psicanálise precisa ser descolonizado”, declarou.

Tecnologia, aceleração e o esvaziamento da subjetividade

Um dos pontos mais discutidos na conversa foi a transformação radical do tempo psíquico na era digital. Teresa observou que a avalanche de estímulos, a conectividade contínua e a lógica algorítmica têm produzido um funcionamento psíquico baseado na resposta imediata, um retorno ao tempo cronológico, estranho aos pressupostos da psicanálise.

“A rede não deixa você ter foco. Tudo é terceirizado: o mundo interno, a fantasia. Isso produz um sofrimento que não víamos há muito tempo”, pontuou, lembrando que o aumento da solidão e do desamparo tem se tornado uma marca da atualidade. Nesse contexto, a clínica se torna um espaço contracultural, onde o tempo pode recuperar sua profundidade.

Trauma, desmentido e a lógica contemporânea das certezas absolutas

Teresa revisitou o modelo de trauma de Ferenczi, enfatizando que o elemento realmente traumático não é o abuso em si, mas o desmentido, o descrédito dado à percepção da criança. Esse mecanismo, segundo ela, ressoa com fenômenos sociais atuais, como a proliferação de fake news e a busca por verdades absolutas.

Para Teresa, vivemos um momento de recusa radical da ambivalência. É nesse cenário que se reinstala a identificação com o agressor, mecanismo que, ampliado para o campo social, ajuda a compreender adesões a discursos autoritários e movimentos extremistas.

“A catástrofe narcísica é esse esvaziamento do sujeito, que renuncia à própria interioridade e se torna um ser de multidão”, assinalou Teresa.

Ternura como resistência e horizonte ético

Apesar do diagnóstico duro, Teresa concluiu sua fala reafirmando a aposta que sustenta o final de seu livro: a ternura. Inspirada por filmes como Dias Perfeitos e Paris, Texas, ela destacou que a ternura é o único sentimento não narcísico, um olhar para o outro que produz encantamento, abertura e possibilidade.

“A única saída é a ternura”, afirmou. “Se não houver fantasia, interioridade e tempo para estar consigo mesmo, as pessoas enlouquecem. A ternura é a brecha, é o que resta de humano na experiência contemporânea”, frisou Teresa Pinheiro. 

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