“ E agora, José?
A festa acabou,
a luz apagou,
e o povo sumiu,
a noite esfriou,
e agora, José?
E agora, você?”
Versos de Carlos Drummond de Andrade em seu poema: “JOSÉ”
O povo viveu um sonho, realizou um sonho! Deu conta? Deu. Aos trancos e barrancos, apesar de críticas coerentes e incoerentes, deu. A festa foi linda, maravilhou a todos daqui e do mundo. Mostrou criatividade, afeto, generosidade, e essa característica do brasileiro ser acolhedor, apaixonado pelo que é e faz, crente que a esperança não morreu e que, mesmo vivendo uma crise grave, há espaço para mostrar seus recursos e seus desejos de ser um povo reconhecido, querido e propenso a ser mais uma nação que mostra a importância da Educação através do Esporte.
Ganhamos bronze, prata e ouro; recebemos os nossos convidados com carinho, sem “síndrome de baixa estima”. Perdemos, perdemos como qualquer que na competição sabe, que derrota e vitória é um conjunto que nunca se excluem. O importante é não transformar a vitória em arrogância, a derrota em fracasso; o importante é aprender com a experiência vivida e retirar daí, capacidade para melhorar, crescer e se desenvolver. Estamos de parabéns, todos, principalmente os atletas que nos brindaram com alegrias, emoções fortíssimas, dentro do clima escuro, sombrio, imprevisível e às vezes amedrontador das dificuldades políticas e econômicas. Sonhar é um direito psíquico, o que é perigoso é pensar que só de sonhos a vida é feita. Acordar, pensar, refletir são verbos necessários nesse momento de impasse político que estamos a viver.
E agora José? Diz o nosso poeta maior. E agora, senhores do poder? Para mim um fato se mostrou sintomático demais: a consciência política do povo brasileiro fez com que os governantes e políticos estivessem ausentes, pois não caberia misturar e partilhar a alegria com aqueles que nos devem demais! Isso foi um aviso, e parece que deu certo. A Nação não aguenta mais a demagogia e o uso do poder como barganha de enganação, traição, promessas jamais cumpridas e aparência de sentimento político-social-humanitário. O Brasil mudou, o povo brasileiro sabe que a “festa acabou”, e sabe que é hora de retomar projetos de mudanças estruturais, caso contrário as nossas medalhas e o fogo olímpico se apagarão em cinzas depressivas de uma morte anunciada. Que os governantes aprendam com nossos atletas que conseguiram que chorássemos de emoção e alegria ao som do Hino Nacional, tentando resgatar o sentimento patriótico quando se mostra um feito social! “Somos todos olímpicos” repetiam sempre os nossos comunicadores! Somos todos olímpicos só nas Olimpíadas? Não é o que se espera nesse momento. Na política existe um jogo olímpico, ou um jogo perverso de rivalidade patológica, ciúme, inveja e competição nefastas? Que os nossos políticos apreendam afinal, que jogar é lúdico. Jogar é um exercício de grupo onde os adversários têm um fim maior —-o bem social, o bem do grupo por excelência, e não as vantagens narcísicas e perversas de um individualismo mortífero que joga para ferir, atacar, estragar e às vezes matar, para dessa maneira, auferir lucros e vantagens do sangue vampirizado.
E agora? Que fim dará os nossos eleitos (?), pois todos aqueles que vibraram e choraram de alegria e dor nas Olimpíadas, estão fragilizados demais para suportar a dor maior de uma falta de reforma política e econômica nesse momento perigoso que atravessamos. Com o coração de quem sofre demais não se brinca! Não queremos que o ódio prevaleça ao amor, como também não desejamos que a democracia se transforme em restos mortais de uma anarquia ou a reaparecimento de regimes totalitários, fundamentalistas e destrutivos!
Termino hoje com o final do poema de Drummond:
“Se você gritasse,/ se você gemesse,/ se você tocasse,/ a valsa vienense,/ se você dormisse,/se você cansasse,/ se você morresse…
Mas você não morre,/ você é duro, José!
Sozinho no escuro/ qual bicho do mato,/ sem teogonia, sem parede nua/ para se encostar, / sem cavalo preto/ que fuja a galope, /você marcha, José!
José, para onde?”