Rosas entregues aos policiais

Um presente amoroso da população de Brasília!

Para a hora do Temor
“Silêncio é tudo que tememos.
Na voz há resgate.
Mas silêncio é infinidade.
Não tem face”.

Poema de Emily Dickinson, no “Um Livro de Horas”, Editora Scipione.

O céu não era a plenitude do azul como acontece sempre em Brasília; o céu era encoberto, acanhado, atemorizado e sem coragem de se abrir frente ao dia em que se comemorava trinta anos de Democracia. Azuis, verdes, brancos vestiam crianças, jovens, adultos, filhos, pais e avós. Do Planalto Central frente ao Palácio, o aparato policial se postou firme temendo revolta, baderna, vandalismo e atos destrutivos. Nada disso esteve nos corações da população brasiliense, população que votou e não votou no Governo; população que mostrou consideração, afeto, respeito e muito mais: o direito legítimo de exigir mudanças, reformas, o começo do fim (?) da Corrupção e, principalmente, uma reforma política e econômica que possam dissolver a “angústia da descrença”, nosso maior desconforto atual.

Não houve bandeiras partidárias (os partidos estão todos comprometidos) e algumas pessoas que apareceram vestidas de emblemas partidários foram tratadas com veemência pela própria população. Não foram movimentos de esquerda, direita, centro, até porque foi-se o tempo desses adjetivos; tratou-se de uma clamor civilizado, de respeito pela ordem social, de “as últimas rosas entregues ao Poder”, metáfora sublime, concretamente entregues aos policiais, como um símbolo de Amor e não de Ódio, ódio este esperado por alguns — assim teria um pode expiatório para projetar a CULPABILIDADE — o mecanismo projetivo que é uma arma psicótica, poderosa, para colocar em alguém aquilo que é de si, e assim, se eximir e se colocar na vala da VITIMAÇÃO!

Há anos que o povo brasileiro não demonstrava de uma maneira amadurecida, sem sentimentos ressentidos e vingativos uma atitude sadia de protestos legítimos dos seus direitos sem carregar flâmulas, bandeiras e adesivos de PARTIDOS POLÍTICOS, até porque, estamos mergulhados na “experiência da descrença”, exatamente pela falta de maturidade e conduta ética dos próprios partidos, facções não interessadas no bem comum, e sim nas vantagens decorrentes do uso perverso de suas funções. Um milhão e oitocentos eleitores que votaram e não votaram no Governo, deram um exemplo de Democracia, civilidade e consciência da crise que atravessam, clamando nas ruas, suas angústias e seu desespero.

“Silêncio é tudo que tememos”, verso de uma das maiores poetas da Literatura Universal, pois ela se afastou do mundo, para quem sabe, fosse ouvida na escritura política dos poetas, desacreditada pela barbárie de uma sociedade onde o Ter nunca respeita o Ser, fato que na maioria das mentes dos homens de governo e de representantes das classes dominantes se observa dia a dia.

Flores e pétalas de rosas entregues aos policiais, foram atos poéticos de corações cheios de amor, na metáfora que não se quer golpes militares, revanches destrutivos e sim, quem sabe, pela última vez, que possamos ser ouvidos, acolhidos. Democracia não é só ouvir nem acolher, é dar demonstração (urgente) de atos que respondam às “últimas pétalas das flores antes que elas murchem”. Não é tempo de esperar mais, “quem sabe faz a hora, não espera acontecer”. Quem não lembra os gritos de Vandré! Queremos todos uma urgente reforma política, uma economia realística e principalmente que o governo eleito, os poderes instituídos pela democracia não neguem a Crise, nem tampouco neguem que “receberam flores” como um pedido de respeito e amor mas também, uma exigência popular de Compromisso Social.

No mesmo livro de poesias de Emily Dickinson, citado acima, há outro poema que ela deu um título — coisa rara na escrita da poetisa: “Para a Hora do Remédio”, diz assim:

“Dizem: —-Com tempo passa.
Mas não passa, na verdade.
Sofrimentos enrijecem
Com tendões, com a idade.

Tempo testa o sofrimento,
Mas não é o seu remédio.
Se passa ao passar o tempo,
Não havia enfermidade”.

O Brasil, os brasileiros e brasileiras não podem mais esperar! A maior angústia humana é a angústia do “grito do bebê” quando a mãe demora demais em atendê-lo. Esse bebê não cresce, não se desenvolve e mais, vai carregar por toda a sua vida, todas as razões para achar o caminho da perversidade como consequencia da Grande Ausência. Na linguagem psicanalítica de hoje, chamamos isso de “filhos de mães mortas, insensíveis, indiferentes, gélidas e sem nenhuma capacidade interna de amorosidade” Um filósofo atual, coreano, Byung-Chul Han, chama nossa geração, de “A Sociedade do Cansaço”, título de um recente livro seu, editado ainda em espanhol pela Editora Herder, Barcelona, 2012.

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