Introgressão: trauma e identificação com o agressor

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Sociedade de Psicanálise de Brasília realiza encontro sobre “Introgressão: o trauma e a identificação com o agressor”

Evento proporcionou reflexões  sobre a clínica do trauma e os desdobramentos teóricos propostos por Sándor Ferenczi.

Na quarta-feira, 25 de junho, a Sociedade de Psicanálise de Brasília, por meio de sua Diretoria Científica, promoveu um encontro que contou com a exposição sensível da psicóloga clínica Luiza Moura. Com o tema “Introgressão: o trauma e a identificação com o agressor”, o evento proporcionou reflexões  sobre a clínica do trauma e os desdobramentos teóricos propostos por Sándor Ferenczi.

Perspectiva histórica e o legado de Ferenczi
Luiza Moura apresentou um panorama histórico do conceito de identificação com o agressor, originalmente proposto por Ferenczi em 1932. Destacou o trabalho clínico do autor húngaro – contemporâneo de Freud – que se destacou por seu trabalho com populações marginalizadas e por sua abordagem inovadora em relação ao trauma. Ferenczi, diferente de Freud, priorizava a prática terapêutica e criticava à negligência da psicanálise em relação ao impacto do trauma real.

Trauma, compulsão à repetição e novas compreensões
No evento foi abordado também a compulsão à repetição como importante tema que impulsionou o desenvolvimento da teoria psicanalítica. Ferenczi, diante de pacientes autodestrutivos, buscou entender além da teoria dualista da pulsão de morte, enfatizando o impacto do trauma real. Conceitos como autotomia – sacrificar partes de si como forma de sobrevivência – e autoplastia – adaptação psíquica diante de ameaças extremas – foram apresentados como expressões de mecanismos de autopreservação.

Identificação com o agressor: entre defesa e sobrevivência
O ponto alto do debate foi o conceito de identificação com o agressor, que, ao contrário de interpretações anteriores, é proposto por Ferenczi como um mecanismo de defesa, e não como um desejo consciente. Essa clivagem permite sobreviver ao trauma, minimizando a sensação de vulnerabilidade, mantendo um vínculo com o agressor quando este é uma pessoa importante da família às custas da perda da confiança pessoal e, inclusive, com movimentos de auto culpabilização como defesa. A síndrome de Estocolmo foi evocada como uma possível manifestação clínica dessa dinâmica.

Arte, linguagem e afetos na clínica do trauma

Durante o encontro, a diretora científica da SPBsb, Nize Nascimento, compartilhou o poema “Era só um carinho”, de Neusa Amaral, interpretado por Heloisa Périssé, como expressão sensível do trauma infantil e de seus efeitos silenciosos, abrindo espaço para refletir sobre os mecanismos de sobrevivência psíquica.

O psicanalista Carlos Vieira, membro didata da SPBsb, trouxe a importância da linguagem na clínica, destacando a necessidade de o analista criar formas de nomear o que é invisível e intangível, reforçando o valor do amor como eixo terapêutico.

Selme Cristine, membro do IPVLB, comentou a clínica da cisão e da identificação com o agressor, observando que esse mecanismo pode tanto facilitar o acesso ao tratamento quanto intensificar o sofrimento psíquico. A palestrante Luiza Moura acrescentou que a interpretação, quando conduzida com cuidado, deve preservar o afeto e o vínculo, nunca os brutalizar.

A psicanalista Teresa Lírio, membro titular da SPBsb, compartilhou no grupo de membros da sociedade uma importante questão: a possibilidade de o mecanismo de identificação com o agressor atingir também testemunhas do trauma. Ela observou que irmãos de uma criança abusada, por exemplo, podem desenvolver defesas semelhantes. E, em tom mais ampliado, associou esse fenômeno à idealização de líderes abusivos no campo social. “É doloroso desamar”, afirmou.

Introgressão, desmentida e sabedoria do trauma

Luiza Moura aprofundou o conceito de introgressão, relacionando-o à violência da ação e ao trauma precoce. Destacou também o efeito devastador da desmentida — a negação do trauma pelo meio externo — que frequentemente impossibilita a denúncia e fragiliza os vínculos afetivos.

A participante Patrícia Moraes trouxe ao debate o documentário A sabedoria do trauma, de Gabor Maté, que propõe uma escuta clínica sensível aos recursos de sobrevivência que se expressam como sintomas. Foi ressaltada a importância de uma escuta que acolha não apenas as palavras, mas também os silêncios, e que confie na verdade emocional do paciente.

O futuro da Psicanálise: abertura e transformação

Ao encerrar a reunião, Nize Nascimento citou Freud, relembrando que a psicanálise deve continuar a se abrir e a se transformar, para permanecer viva e acessível.

O encontro reafirmou a importância de compreender mecanismos de defesa como a identificação com o agressor e a introgressão, para que a escuta clínica se torne cada vez mais afinada com os modos singulares de sobrevivência e com a potência do vínculo terapêutico.




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